I Pedro 3:19
Introdução
Os católicos, e
até protestantes afirmam que enquanto Cristo esteve morto, passou este tempo
pregando aos espíritos em prisão. Justificam esta crença baseados em I Pedro
3:18-20.
Estaria esta crença
em harmonia com o ensino geral das Escrituras Sagradas?
De modo nenhum,
porque afirmar que entre a crucifixão e a ressurreição, Jesus foi a algum
lugar, ou desceu ao Hades, selecionou os espíritos dos antediluvianos, dos dias
de Noé, e lhes pregou, concedendo-lhes segunda oportunidade, seria crer que a
Bíblia advoga esta segunda oportunidade e também o estado de consciência na
morte; da existência de algum lugar, como seja o purgatório, onde estão os
espíritos desencarnados, doutrinas estas estranhas ao Livro Sagrado.
A resposta às
perguntas que se seguem nos ajudará a equacionar o problema de conformidade com
"um assim diz o Senhor":
1ª) Quem eram
os espíritos que estavam em prisão?
2ª) Que espécie
de espíritos eram? Vivos ou mortos?
3ª) Quem lhes
pregou?
4ª) Quando lhes
foi pregado?
5ª) Pode a
verdade ser ensinada aos mortos?
6ª) Defende a
Bíblia a crença numa segunda oportunidade após a morte?
7ª) Qual é a
prisão mencionada em 1 Pedro 3: 19?
8ª) será que
houve algum problema com copistas ou de tradução, tornando a passagem obscura?
Comentários Gerais
1ª) Quem eram
os espíritos que estavam em prisão?
A Bíblia usa
espírito como sinônimo de pessoa, o ser humano vivente. Em I Cor. 16:18 –
"Porque trouxeram refrigério ao meu espírito, isto é, a mim, a minha
pessoa." Gál. 6:18. "A graça de nosso Senhor Jesus cristo seja
irmãos, com o vosso espírito." Vosso espírito, quer dizer convosco, a
vossa pessoa.
A primeira
parte do verso 20 de I Pedro 3 parece identificá-los com as pessoas que viviam na
Terra. Eram seres humanos reais, como as "oito almas" que se salvaram
na arca.
2ª) Eram estes
espíritos vivos ou mortos?
O termo
espírito só é usado na Bíblia com referência aos vivos. Paulo em Heb. 12:22 e
23 dá as boas vindas aos novos membros que ingressaram na igreja –
"espíritos dos justos aperfeiçoados". O apóstolo faz referências a
pessoas viventes.
Em Núm.
27:15-16, relata que Moisés, no término da vida, roga que um líder, dentre os
vivos o substitua. O texto fala dos "espíritos de toda a carne", isto
é, seres vivos e não mortos.
Adam Clarke,
vol. VI, pág. 862, comentando esta passagem conclui pela impossibilidade de se
tratar de "espíritos desencarnados", pois diz que a frase "os
espíritos dos juros aperfeiçoados" (Heb. 12:23) certamente se refere a
homens justos, e homens que se acham ainda na igreja militante; e o Pai dos
Espíritos (Heb. 12:9) tem referência a homens ainda no corpo; e o "Deus
dos Espíritos de toda a carne" (Núm. 27:161 significa homens, não em
estado desencarnado".
3ª) Quem lhes
pregou?
O Dr. João Pearson, em sua Exposição do Credo, obra clássica da
Igreja Anglicana, observa: "É certo, pois, que Cristo pregou àquelas
pessoas que nos tempos de Noé foram desobedientes, em todo o tempo em que a
longanimidade de Deus esperava e, conseqüentemente, enquanto era oferecido o
arrependimento. E é igualmente certo que Ele nunca lhes pregou depois de
haverem morrido". Este eminente teólogo, crente na imortalidade da alma,
afirma que esta passagem não ensina tal doutrina.
As palavras
"no qual" do verso 19 podem tanto referir-se ao Espírito Santo como a
Cristo. O Comentário Bíblico Adventista,
bem identificado, entre nós, pelas siglas SDABC,
apresenta três explicações para a expressão "no qual".
a) "No
qual" refere-se ao termo anterior "Espírito" e o verso 19,
significa que Cristo pregou aos antediluvianos, pelo Espírito Santo, através do
ministério de Noé.
b) "No
qual" refere-se ao termo anterior para a versão preferida,
"espírito" que é a referência a Cristo, em seu estado preexistente,
um estado que, como a sua glorificada natureza na pós-ressurreição, pode ser
descrito como no "espírito". Compare a expressão: "Deus é
espírito" João 4:24. A pregação de cristo foi para os antediluvianos,
"enquanto se preparava a arca", portanto durante o seu estado
preexistente.
c) "No
qual" refere-se ao verso 18 como um todo, e o verso 19 significa que em
virtude da sua ainda futura morte vicária e ressurreição no
"espírito" Cristo foi e pregou "aos antediluvianos através do
ministério de Noé. Foi em virtude do fato, de que Jesus foi "morto na
carne, mas vivificado no espírito" (verso 18), que Ele primitivamente
pregou a salvação através de Noé e "foram salvos através da água",
aqueles que a aceitaram. Semelhantemente é "por meio da ressurreição de
Jesus Cristo" que o batismo agora também nos salva" (verso 21).
"A
primeira destas explicações é aceita se a expressão "no qual" se
refere ao Espírito. A segunda e a terceira estão mais de acordo com a
construção grega (dos versos 18 e 19), com o contexto imediato e com as
passagens paralelas de outras partes do Novo Testamento".
4ª) Quando lhes
foi pregado?
No verso 21 há
a expressão "noutro tempo", que claramente se identifica com o tempo
em que "a longanimidade de Deus aguardava nos dias de Noé". O tempo era
os dias de Noé, os 120 anos durante os quais Deus procurou libertá-los da
prisão do pecado.
5ª) Pode a
verdade ser ensinada aos mortos?
O ensino das
Escrituras sobre o estado do homem na morte não admite tergiversações. Elas
claramente nos afirmam que não há consciência na morte. Basta ler: Salmo 146:4;
Ecles. 9:5, 6, 10; Mat. 10: 28; João 11:11; I Tes. 4:13.
Isaías 38:18 e
19 nos afiança que não há nenhuma esperança dos mortos aceitarem a salvação.
6ª) Defende a
Bíblia a crença numa segunda oportunidade após a morte?
Os ensinamentos
bíblicos são muito evidentes em nos mostrarem que há apenas uma oportunidade
para a salvação, isto é, nesta vida.
A leitura de
apenas algumas passagens, como II Cor. 6:1-2; Heb. 3:7-8; 6:4-6; 9:27; Rom. 2:6
elucida bem o assunto.
A doutrina da
segunda oportunidade é antibíblica, portanto não deve ser aceita.
7ª) Qual é a
prisão mencionara em 1 Ped. 3:16-20?
No salmo 142:7
Davi suplicou que Deus tirasse a sua alma da prisão.
Prov. 5:22 nos
afirma que a prisão que traz a alma prisioneira é a prisão do pecado.
Isaías 42:6-7
nos informa que o trabalho de Cristo, quando viesse à Terra seria "tirar
da prisão os presos". O mesmo profeta messiânico no capítulo 61:1
profetizou a libertação dos cativos do pecado, por Cristo. Lucas 4:18 afirma
que Cristo em sua cidade natal, aplicou as palavras de Isaías ao Seu
ministério. O Espírito do Senhor me ungiu para proclamar libertação às almas
presas pelo pecado.
Os seres a quem
Jesus pregou "espíritos em prisão" eram pessoas presentes e bem
vivas.
Que os
antediluvianos estiveram bem presos na prisão do pecado é facilmente deduzível
da leitura de Gên. 6:5-13.
8ª) Seria
possível um erro de tradução ou omissão de alguma palavra por copistas?
A tradução de Moffatt para o inglês é diferente,
pois reza assim: "Cristo foi morto na carne, porém volveu à vida no
Espírito. Também no Espírito Enoque foi e pregou aos espíritos em prisão, que
haviam desobedecido no tempo quando a paciência de Deus aguardou, enquanto era
construída a arca, nos dias de Noé."
Por que Moffatt introduz na sua
tradução a palavra Enoque, que não aparece em nenhum manuscrito grego?
Ao considerar
qualquer trecho em grego, os eruditos, freqüentemente, utilizam um processo,
que se chama emenda. Este processo consiste no seguinte: Às vezes, os
estudiosos crêem haver encontrado algo incorreto no texto como se encontra,
porque algum escriba, parece haver copiado erroneamente, tornando o texto sem
sentido. Portanto sugerem que determinada palavra deveria ser trocada, ou agregada
alguma outra, mesmo que essa palavra não apareça em nenhum manuscrito grego.
No que se
refere a esta passagem, Rendel
Harris sugeriu, que ao copiar o manuscrito de Pedro se omitiu a palavra
Enoque e que deveria ser reincorporada. Ele diz que entre as palavras "kai" e "toi" se havia omitido a
palavra Enoque.
A razão que ele
apresenta para isto é a seguinte: Como a cópia dos manuscritos se fazia por
ditado, os escribas estavam expostos a omitir palavras que aparecendo em
sucessão tivessem um som semelhante – en ho kai Enoque.
É uma sugestão
interessante e engenhosa, mas que não devemos aceitar por falta de evidências
comprobatórias.
Segue-se uma
explicação para esta passagem dada por Artur S. Maxwell, aparecida na Revista Adventista, setembro de 1962,
pág. 8:
"Na
primeira epístola de S. Pedro ocorre esta estranha afirmativa: I Ped. 3:18-20.
Naturalmente, somos levados a indagar: Quem eram os espíritos em prisão? Como
podia Cristo lhes pregar e quando? Não haverá aqui algum erro? Não. Se
compararmos esta passagem com a história do dilúvio, em Gênesis 6, tudo se
torna claro. As palavras "no qual" referem-se ao Espírito Santo, e
foi por esse Espírito que Cristo pregou aos 'espíritos em prisão', que no
versículo 20 são definidos como pessoas que 'noutro tempo foram desobedientes'.
Esse 'noutro tempo' é claramente identificado como o tempo em que 'a
longanimidade de Deus aguardava nos dias de Noé.' Assim, o tempo eram os dias
de Noé, o lugar era o mundo antediluviano, e o meio pelo qual Cristo contendia
como homem era seu santo Espírito – fato claramente expresso em Gênesis 6:3. O
ministério de Noé, ministério presidido e motivado pelo Espírito, durou 120
anos – tempo durante o qual Deus procurou libertar o povo da prisão do pecado e
salvá-lo na arca. A maior parte recusou o convite, salvando-se 'através da
água', apenas 'oito pessoas'."
Conclusões
Sintetizando as
idéias aqui apresentadas concluímos com o sumário feito por Mary E. Walsh, em seu estudo bíblico
sobre esta problemática passagem.
1. "Espírito"
– verificamos referir-se a seres vivos, e não a pessoas mortas.
2. "Prisioneiro"
– pessoa presa aos seus maus hábitos. Está na prisão do pecado.
3. Cristo,
enquanto esteve na Terra pregou, na sinagoga de Nazaré a almas aprisionadas.
Sua mensagem visava libertá-las do pecado. Tanto Cristo quanto as pessoas a
quem Ele pregava, estavam vivos.
4. Ao
ler com atenção I S. Pedro 3:18, verificamos que o Espírito Santo que
ressuscitou dos mortos a Cristo, foi o meio usado por Cristo para advertir o
povo do tempo de Noé, de que estava iminente o dilúvio e se preparassem para
entrar na arca. Não obstante, eles rejeitaram a mensagem, e somente Noé e sua
família foram salvos.
Não há, pois,
nestes passos, insinuação alguma de que enquanto esteve na sepultura, Cristo
haja pregado. Essa doutrina é ensinada pela Igreja católica, sem apoio nas
Escrituras". – O Ministério
Adventista, Março/Abril, 1963, pág. 23.
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