Introdução
As mensagens
bíblicas são divinas, já que as idéias ou pensamentos foram inspirados por
Deus, sob a orientação do Espirito Santo; porém, o modo de se expressar ou as
palavras escolhidas são dos homens. Assim sendo é evidente que o profeta e
outros escritores sagrados se serviram de suas habilidades e dos elementos de
cultura da sua época. Como os costumes são alterados e as culturas
ultrapassadas, torna-se difícil a compreensão de textos bíblicos escritos em contextos
históricos milenares. Acrescido a este há o problema das cópias e traduções que
contribui, às vezes, para que o texto sagrado não transmita exatamente a idéia
do original. Após estas afirmações é fácil concluir que, muitas vezes, é
necessário grande esforço e a orientação divina para que o pesquisador chegue a
conclusões corretas concernentes ao que o mensageiro de Deus queria transmitir.
No Novo
Testamento, um dos textos que tem sido tema para muitas discussões é Lucas
16:16, que aparece na tradução de Almeida Revista e corrigida:
"A lei e os profetas duraram até João;
desde então é anunciado o reino de Deus, e todo o homem emprega força para
entrar nele."
O profícuo
ministério de Cristo, visando salvar o homem, encontrou os mais variados obstáculos.
Uma leitura atenta dos Evangelhos nos revelará que seus maiores inimigos e os
mais acérrimos questionadores não foram os ignorantes, mas os mestres de então
– os saduceus e fariseus.
O contexto da
passagem de Lucas 16:16 nos indica, que Cristo usou este verso num diálogo com
os fariseus, que estavam ridicularizando ou minimizando as sublimes
características messiânicas de Jesus. Foi para estes fariseus que Cristo
declarou:
"A lei e
os profetas vigoraram até João" – em outras palavras, eles ouviram a
declaração do Mestre do cumprimento da lei e dos profetas em João.
Esta frase
pronunciada há quase dois mil anos, retirada do seu contexto, tem sido usada
por alguns comentaristas, como uma das principais provas bíblicas, da abolição
dos 10 mandamentos com Cristo.
A finalidade
primordial desta análise exegética é esclarecer e orientar os sinceros
estudantes das Escrituras, de que nada existe neste texto, que possa ser usado
como prova da anulação da eterna, santa e imutável lei de Deus.
Comentários sobre o Texto
Para uma
carreta interpretação de qualquer texto, o primeiro passo é ir ao original,
neste caso ao grego, para ver como lá se encontra.
Lucas o
escreveu assim:
o
nomov kai oi profhtai ewv iwannou.
Ho nómos kai hoi profetai ews Ioanu.
Sua tradução
literal será: A lei e os profetas até João.
Como ponto de
partida para a boa compreendo deste verso, é necessário saber que as palavras duraram, vigoraram ou existiram,
que aparecem em algumas versões não se encontram no original. Um destes
sinônimos foi introduzido como um acréscimo ou recurso usado pelo tradutor para
complementação do sentido. Observe bem que na tradução de Almeida Revista e
Corrigida "duraram" aparece em itálico, como prova de que não se
encontra no grego.
Os três mais
relevantes princípios hermenêuticos devem ser aplicados neste estudo para
sabermos o que Cristo quis declarar. (Veja estes princípios no capítulo –
Predestinação Bíblica).
Para uma
adequada compreensão do seu sentido a passagem paralela de Mateus 11:13 deve
ser colocada ao lado desta, porque diz a mesma coisa, mas com muito mais
clareza:
"Porque
todos os profetas e a lei profetizaram até João".
Mateus nos
esclarece que Lucas jamais pretendeu declarar que a lei e os profetas
terminaram nos dias de João, mas simplesmente afirma que eles profetizaram até
aquele tempo a respeito de Cristo.
A Bíblia está
repleta de provas de que a lei e os profetas continuaram depois de João.
1ª) A Lei
Como poderia o
Senhor estar afirmando em Lucas 16:16 que a lei se tornara perempta ou fora
suprimida quando no verso seguinte declara alto e bom som: "E é mais fácil
passar o céu e a terra, do que cair um til sequer da lei".
Mateus nos
informa da lealdade de Cristo à lei: "Não cuideis que vim destruir a lei e
os profetas". Mateus 5:17.
Na sua palestra
com o jovem rico, nosso Senhor o advertiu: ". . . se queres, porém, entrar
na vida, guarda os mandamentos".
2ª) Os Profetas
A Bíblia fala
de muitos profetas nos tempos apostólicos.
Atos2:17-18 –
"... e profetizarão".
Atos 19: 6 –
". . . e . . . profetizavam".
Atos 21:7-9 –
"Filipe tinha quatro filhas donzelas, que profetizavam".
l Cor. 14:29 –
"Tratando-se de profetas, falem apenas dois ou três, e os outros
julguem".
Os antinomistas
são incoerentes em suas afirmações, porque ao declararem que a lei de Deus foi
abolida depois de João, afirmam:
a)
A Lei parou com João Batista, o precursor de Cristo.
b)
A Lei vigorou até a 1ª vinda de Cristo.
c)
A Lei de Deus findou na cruz.
Vemos aqui o ilogismo cronológico de três abolições da Lei.
O estudo do
contexto é muito útil para melhor compreensão do assunto, pois este nos indica
que nem Mateus nem Lucas está discutindo os Dez Mandamentos. Pelo contexto
sabemos que muitos dos judeus eram descrentes da missão e do caráter de Cristo
e do Seu precursor. Afirmavam sua crença em Moisés e em todos os profetas.
Cristo procurou insistentemente provar-lhes que Ele era Aquele de quem os
profetas falavam e que o reino de Deus lhes estava sendo pregado através de
João Batista.
Qual o Real significado da Frase: "A Lei e os
Profetas Até João"?
"A lei e
os profetas". Isto é, os escritos canônicos do VT (vide Mat. 5:17; 7:12;
22:40; Luc. 24:27, 44; Atos 13:15; 28:23; vide Luc. 24:44).
"Até
João". Isto é, João Batista. "Até" a pregação do "reino de
Deus" por João os sagrados escritos do VT constituíam a orientação
primária do homem para a salvação (veja Rom. 3:1, 2). A palavra "até"
(gr. mechri) de maneira nenhuma implica – como alguns expoentes
superficiais da Escritura querem nos fazer crer – que "a lei e os
profetas", as Escrituras do VT, de algum modo perderam seu valor ou força
quando João começou a pregar. O que Jesus quer dizer aqui é que até o
ministério de João "a lei e os profetas" eram tudo o que os homens tinham.
Veio o evangelho, não para substituir ou anular o que Moisés e os profetas
tinham escrito, mas antes suplementar, reforçar, confirmar aqueles escritos
(veja s. Mat. 5:17-19). O evangelho não toma o lugar do VT, mas é adicionado a
ele. Este é claramente o sentido em que mechri (também traduzido
"para") é usado em tais passagens da Escritura como Mat. 28:15 e Rom.
5:14.
Através do NT
não há nenhum exemplo em que o VT é de algum modo depreciado. Pelo contrário, é
nas Escrituras do VT que os crentes do NT encontravam a mais forte confirmação
de sua fé; de fato, o VT era a única Bíblia que a primeira geração da igreja do
NT possuía (veja João 5:39). Eles não o desprezavam, como fazem alguns hoje que
se intitulam cristãos, mas honravam e estimavam-no. De fato, nesta mesma ocasião
Jesus estabeleceu os escritos do VT como suficientes para conduzir os homens ao
céu (veja Luc. 16:29-31). Aqueles que ensinam que as Escrituras do VT são sem
valor ou autoridade para os cristãos, ensinam o contrário do que Cristo
ensinou. Paulo afirmou que seus ensinos incluíam "nada mais além daquilo
que os profetas e Moisés disseram que viria". (Atos 26:22). Em seu ensino
Paulo se referia constantemente à "lei de Moisés" e aos
"profetas" (veja Atos 28: 23).
No sermão da
Montanha Jesus deixou claro que Seus ensinos de modo algum punham de lado os do
VT. Ele declarou enfaticamente que não veio tirar das Escrituras do VT o menor
"jota" ou "til" (veja Mat. 5: 18). Quando Ele declarou
"mas Eu vos digo" (veja v. 22), o contraste que Ele delineou entre os
ensinos do VT e Seus ensinos, não tinha em vista diminuir o valor ou
importância dos primeiros, mas antes libertá-los dos estreitos conceitos dos
judeus de Seus dias e amplificar e fortalecê-los.
Desde aquele
tempo. Desde a proclamação do reino de Deus por João Batista, luz adicional tem
estado a brilhar sobre o caminho da salvação, e os fariseus não tinham qualquer
escusa para serem "cobiçosos" (veja v. 14). Tinha havido luz
suficiente para eles no VT (veja vs. 29 a 31), mas eles tinham rejeitado aquela
luz (João 5:45-47); agora eles tomavam a mesma atitude em relação à luz em
acréscimo que brilhava através da vida e ensinos de Jesus (veja João 1:4;
14:6)."
Estas
explicações se encontram no SDABC,
Vol. V, págs. 828-829.
Conclusão
De conformidade
com os ensinos de Cristo, a analogia das Escrituras, a comparação de passagens
paralelas, e o contexto do verso, a única conclusão a que se chega é:
Uma melhor
tradução da passagem seria: A lei e os profetas foram pregados até João.
À luz do que
nos ensina claramente a Palavra de Deus, e apoiados no testemunho de abalizados
comentaristas podemos concluir, sem nenhuma dúvida, que a lei de Deus permanece
como disse Barclay:
"inalterada e inalterável".
A Lei dos Dez
Mandamentos representa o caráter de Deus, portanto é tão eterna quanto Ele
próprio.
A afirmação de
que o Velho Testamento foi proscrito juntamente com os profetas, não encontra
base nos ensinamentos de Cristo nem nas declarações dos escritores do Novo
Testamento. Veja Atos 26:22; 28:23.
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